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Crônica | Sociologia: a arte de ver o invisível (A importância da Sociologia nas questões contemporâneas)

por João Saraiva


A Sociologia desempenha um papel fundamental na compreensão e análise das questões contemporâneas que permeiam a nossa sociedade. Seja no cenário político, econômico, cultural ou social, a Sociologia fornece as ferramentas necessárias para interpretar os fenômenos e transformações que ocorrem em nosso cotidiano.

Em tempos de polarizações apressadas e opiniões que mal cabem em 280 caracteres, pensar com profundidade parece um luxo. Mas não é. É urgência. E é aí que entra a Sociologia, essa ciência inquieta que se recusa a aceitar o mundo como ele se apresenta.

Mais do que uma disciplina escolar, a Sociologia é um convite ao espanto inteligente: por que naturalizamos o que deveria nos escandalizar? Por que aceitamos como destino o que foi, na verdade, uma construção social?

Quando Émile Durkheim nos ensinou a tratar os fatos sociais como coisas, ele não estava apenas propondo método — estava nos chamando a olhar com rigor o que parecia banal: o suicídio, a religião, a educação. Quando Karl Marx apontou a luta de classes como motor da história, ele nos deu ferramentas para compreender a desigualdade que atravessa nossas ruas e nossos salários. Max Weber, ao falar do desencantamento do mundo, já antevia o vazio espiritual de uma modernidade técnica, veloz e — muitas vezes — desumana.

Mas a Sociologia não parou nos clássicos. Hoje, nomes como Pierre Bourdieu, com seu conceito de capital cultural, nos ajudam a perceber por que alguns já nascem com a vitória no bolso — e outros, com o mundo nas costas. Zygmunt Bauman nos fala de uma modernidade líquida, onde vínculos escorrem e compromissos se desfazem. Djamila Ribeiro, com sua abordagem sobre lugar de fala, nos convida a ouvir o que o sistema sempre silenciou. Boaventura de Sousa Santos nos alerta para a epistemologia do Sul e os saberes que foram sistematicamente apagados.

Num mundo marcado por desigualdades gritantes, intolerâncias religiosas, embates sobre gênero, raça, território, algoritmos e identidades em ebulição, a Sociologia é a lente que nos ajuda a enxergar para além do óbvio. Ela nos mostra que não há natureza em desigualdade — há estrutura, há poder, há história.

Na escola, ensinar Sociologia não é apenas cumprir a carga horária. É oferecer repertório para que os alunos compreendam o lugar onde vivem, e o papel que podem (ou não) ocupar nele. É dar nome àquilo que os oprime. É tirar o aluno da plateia e convidá-lo a ocupar o palco da análise social.

Nos vestibulares mais concorridos do país, a Sociologia aparece discretamente, mas com força. Seja numa redação que exige repertório sociocultural, seja numa questão que exige compreensão de fenômenos complexos, ela está lá — silenciosa, mas decisiva. O aluno que lê Bourdieu interpreta melhor um meme. O que compreende Foucault enxerga o poder nas entrelinhas da lei. O que ouve Angela Davis pensa diferente sobre encarceramento, trabalho e corpo negro.

Ao longo da minha caminhada como professor — em escolas, congressos, aulões e podcasts — vi no olhar dos alunos o brilho que nasce quando alguém descobre que o mundo pode ser lido. E que, ao ser lido, pode também ser transformado.

A Sociologia é isso: uma forma de resistência contra a alienação, uma denúncia contra o silêncio, uma promessa de que ainda é possível pensar com profundidade sem perder a ternura.

Num país onde tantos repetem o que ouviram, pensar por conta própria é um ato político. E o estudo da Sociologia é a melhor escola para isso.

 
 
 

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